O endividamento das famílias no Brasil registrou queda pelo segundo mês consecutivo, de acordo com a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), divulgada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Em agosto, o percentual de famílias com dívidas a vencer caiu para 78%, uma leve redução em relação aos 78,5% registrados em julho. Apesar dessa diminuição, o índice ainda é superior aos 77,4% observados no mesmo período de 2022, indicando que a melhora, embora importante, ocorre de forma gradual.
Uso do crédito e cautela das famílias
A CNC aponta que essa redução reflete uma postura mais cautelosa das famílias quanto ao uso do crédito. No entanto, o número de famílias que se consideram “muito endividadas” aumentou para 16,8%, sugerindo que, embora o volume total de dívidas tenha sido controlado, muitas famílias ainda enfrentam dificuldades significativas para honrar os pagamentos mensais.
Para José Roberto Tadros, presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, o desempenho econômico recente demonstra um cenário complexo: “O resultado do PIB, que apontou um crescimento de 1,4% no segundo trimestre, superou as expectativas, mas também revelou um ambiente econômico ainda desafiador.” A combinação de juros elevados e uma recuperação lenta da economia faz com que as famílias mantenham cautela, o que pode impactar negativamente o consumo e retardar a retomada econômica.
Inadimplência e comprometimento da renda
Embora o endividamento tenha diminuído, a inadimplência continua sendo um ponto de preocupação. O percentual de famílias com contas em atraso permaneceu em 28,8% pelo terceiro mês consecutivo. Além disso, o número de famílias que afirmam não ter condições de pagar suas dívidas aumentou para 12,1%. Outro dado preocupante é o percentual de dívidas em atraso há mais de 90 dias, que chegou a 48,6%, o maior índice desde março de 2020.
De acordo com Felipe Tavares, economista-chefe da CNC, o comprometimento da renda das famílias segue em um patamar elevado, mesmo com a leve melhora no endividamento. “O percentual médio de comprometimento da renda foi de 29,6% em agosto, demonstrando que as famílias estão tentando equilibrar suas finanças, mas ainda enfrentam dificuldades com prazos longos e juros altos”, explicou Tavares.
Perspectivas para o futuro
Apesar da recente melhora, a CNC projeta que o endividamento pode voltar a crescer no último trimestre de 2024, com a inadimplência atingindo 29,5% até dezembro. Esse aumento pode ser impulsionado pelo maior uso de modalidades de crédito, como o cartão de crédito, que ainda lidera entre as famílias endividadas, com 85,7% de participação. Embora tenha havido uma pequena queda em relação ao mês anterior, o cartão de crédito continua sendo o principal responsável pelo endividamento.
Em contrapartida, o crédito pessoal registrou aumento, impulsionado pelas recentes reduções nas taxas de juros. No entanto, o cenário de endividamento varia regionalmente. O Rio Grande do Sul, por exemplo, que enfrentou enchentes em maio, viu seu endividamento subir para 92,9% em agosto, o maior nível desde outubro de 2023, e 39,1% das famílias no estado têm contas em atraso.
Reflexão sobre o endividamento
Diante desse panorama, é essencial que as famílias brasileiras continuem cautelosas no uso de crédito. Apesar da ligeira melhora no endividamento, o aumento da inadimplência e o alto comprometimento da renda ainda são fatores preocupantes. Resta saber se a economia brasileira permitirá uma recuperação mais rápida, ou se o país enfrentará um ciclo prolongado de endividamento.
A queda no endividamento pelo segundo mês consecutivo é um alívio para as famílias brasileiras, mas o cenário ainda demanda atenção. A persistência de altas taxas de juros e uma recuperação econômica lenta impõem desafios. Manter o controle das finanças e usar o crédito de maneira consciente são estratégias fundamentais para evitar um aumento no endividamento e, consequentemente, na inadimplência.